Quanta generosidade com um fascista

fascismo

Renato Dalto (*)

A política brasileira é pródiga em caricaturas prontas: já produziu Jânio Quadros, Fernando Collor e agora esse tal de Bolsonaro, que em vez de substantivo próprio virou adjetivo. Trata-se apenas de um fascista caricato, tentando amealhar o que mais torpe há no senso comum: a ideia de que a ordem substitui a política e que diálogo e direitos civis são coisas de democracias falidas. Apenas isso. Ele é a exacerbação pornográfica da direita que, se for preciso, mantêm a ordem com sangue. Como pornografia é o sexo dos outros (pego emprestado do Millôr Fernandes), há gente tentando levar a sério essa caricatura fingindo dotes democráticos e direito ao contraditório. Como na pornografia, deixam o desejo sórdido para o escurinho da sala e fingem a moral democrática em público. Afinal, pornografia fascista é algo inconfessável.

O problema está nas entrelinhas, onde todos exibem aquele pudor britânico de dialogar com o fascismo, deixam nas entrelinhas uma certa sedução por ele, mas o tom blasé e aparentemente democrático esconde a simpatia pelos adeptos dos tanques na rua. São pessoas aliás que tem uma raiva alojada no fígado da esquerda mas em nome da tolerância tratam respeitosamente o fascismo- aquela ideia odiosa de ordem que terminou em holocausto.

E assim que um Bolsonaro vive seus dias de celebridade, ouriça aeroportos e plenários, ganha mídia, arrasta alguns fanáticos descerebrados e ganha o sutil apoio de quem vê qualquer inimigo da esquerda como um aliado – ou mesmo um aliado de ocasião. Para quem abraça a mesma causa de um Eduardo Cunha, cabe até um Bolsonaro no cardápio.

A passagem da caricatura por Porto Alegre teve ares de espetáculo. Chamou atenção uma entrevista dele à Rádio Guaíba e o debate com o jornalista Juremir Machado da Silva. Esse debate dividiu opiniões e o interessante é que teve gente atacando Juremir, por questionar e polemizar os dotes fascistoides de Bolsonaro, e esboçando uma sutil defesa do herdeiro da treva da ditadura militar, que entre outras coisas sonha com um general como Ministro da Educação.

O problema não é o Juremir. Ele serviu apenas de pretexto para esses cavalheiros e senhoras de ar britânico confessarem, digamos assim, uma certa sedução por Bolsonaro. Pornografia é coisa de quarto escuro, mas vale uma piscada de olho no salão iluminado para palmilhar o escaninho das perversidades não reveladas.

Há divisores de água no curso da história e nisso se inscrevem alguns princípios básicos, como abominar tortura e assassinatos. Mais do que uma questão política é uma questão humana. Como a pornografia. Sexo perverso e pau de arara não se mostram em público. Bolsonaro ao menos é sincero em explicitar sua pornografia política traduzida no fascismo exacerbado. O difícil é entender tanto democrata magnânimo defender generosamente um fascista em nome de desejos inconfessáveis.

(*) Jornalista

Sobre maweissheimer

Bacharel e Mestre em Filosofia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Trabalho com Comunicação Digital desde 2001, quando foi criada a Agência Carta Maior, durante a primeira edição do Fórum Social Mundial. Atualmente, repórter no site Sul21 e colunista do jornal Extra Classe.
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5 respostas para Quanta generosidade com um fascista

  1. Marco Antonio F Schuster disse:

    Bolsonaro não é exatamente a direita. É o mal. No caso, um mal de direita (Churchil, por exemplo, era de direita mas combateu o mal). A nacionalização de sua fama possivelmente representa o início da rotinização do mal no Brasil. Rotinização criada lentamente, e muitas vezes inconscientemente. Bolsonaro é o encontro de discursos menores como os de Levy Fidelix, Malafaia, José Eymael. Um significante ameaçando tornar-se significante vazio e por isso potencialmente vencedor. Ser recebido com reação física violenta faz parte do histórico da banalização do mal (e suspeito que ele gostaria que a violência fosse muito maior do que aconteceu em Porto Alegre). Collor fez isso na campanha de 1989. Mas estamos no início dessa rotinização, “Minha luta” já caiu em domínio público e é possível saber combater esse mal antes que ele se torne imbatível. Não é só a esquerda que precisa olhar para ele com cuidado. Bolsonaro não é consequência da ação da esquerda.

  2. jorge disse:

    Ninguém chuta cachorro morto !!!!

  3. “Para quem abraça a mesma causa de um Eduardo Cunha, cabe até um Bolsonaro no cardápio.” Esta frase define os ‘Bolsonetes’.

  4. Oleti Gomes disse:

    Como esse moço ficou conhecido na mídia, hein? Eu nem sabia quem era Bolsonaro. Há maus espíritos em todos os quatro cantos do Mundo, e, principalmente dentro de Partidos Políticos. Um, quer ser melhor do que o outro. Todo mundo olhando para o seu próprio umbigo. E o País despencando, com falta de tudo. Mas, com excesso de criminalidade, epidemias, pessoas sem caráter (que galgam postos públicos e que se aproveitam da função para se locupletarem, sonegadores, e etc… que desviam as economias dos cofres públicos). Está incontrolável! Esta é a Liberdade que todos almejam? Sem limites… tudo está lindo, maravilhoso! Basta ser moderno e aceitar tudo em nome da “freedom”. As famílias acuadas dentro de suas casas… É isso aí. Ninguém presta atenção na desordem do nosso País. E pra melhorar, ganhamos de graça, e sem controle, a dengue, o Schicungunya e o Zika. Terceiro milagre de Fátima, para quem acredita. Acho até que será a sutil extinção do povinho que habita esse Planeta… apenas uma picadinha indolor! Picadinha letal. Será que nós, e nossos filhos, os quais criamos com tanto sacrifício, merecemos tudo isto?

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